Cibercultura – Exemplo 1: Creative Commons
“A inteligência colectiva constitui mais um campo de problemas do que uma solução. Todos reconhecem que a melhor utilização que se pode fazer do ciberespaço é pôr em sinergia os saberes, as imaginações, as energias espirituais dos que se ligam a ele. Mas em que perspectiva? Segundo que modelo? Trata-se de constituir colmeias ou formigueiros humanos? Pretende-se que cada rede dê à luz um “grande animal” colectivo? Ou, pelo contrário, o que se visa é valorizar os bens pessoais de cada um e pôr os recursos do grupo ao serviço dos indivíduos? A inteligência colectiva é uma forma de coordenação eficaz na qual cada um se pode considerar um centro? Ou pretende-se subordinar os indivíduos a um organismo que os ultrapassa? O colectivo inteligente é dinâmico, autónomo, emergente, fragmentado? Ou bem definido e controlado por uma instância que se sobrepõe a ele? Transforma-se cada um de nós numa espécie de neurónio dum mega cérebro planetário ou queremos constituir uma multidão de comunidades virtuais nas quais se associam cérebros nómadas para produzir e partilhar o sentido? Estas alternativas, que só se recortam parcialmente, definem algumas das linhas de fractura que dividem a partir do seu interior o projecto e a práctica da inteligência colectiva.” (Lévy, 2000, p. 137)
Com a emergência da cibercultura é redefinida a noção de registo (a obra, a criação intelectual ou proprietária) para acompanhar a tendência de virtualização da produção intelectual. Existem também novos registos exclusivos do ciberespaço que é necessário reconhecer (a produção de um blogger ou da Wikipedia, por exemplo). Ao mesmo tempo, o persona autor torna-se potencialmente universal e independente de autorização/validação por parte de instituições (sejam elas mediáticas, científicas, artísticas, …), dependendo da vontade do indivíduo e do seu acesso ao ciberespaço.
Para Lévy, “Se a cibercultura encontra a sua essência no universal sem totalidade, devemos examinar, nem que seja a título de hipótese, as formas de uma arte e de uma cultura para as quais estas duas figuras passem para segundo plano. (…) devemos encarar um estádio futuro da civilização em que estes dois ferrolhos da totalização em declínio terão apenas um lugar modesto nas preocupações dos que produzem, transmitem e apreciam as obras do espírito.” (Lévy, 2000, p. 160). Esse “modesto lugar” é estabelecido, por um lado, pelo lugar herdado do autor e do seu registo, que têm ocupado um lugar central desde a emergência da Galáxia de Gutenberg e que não é facilmente anulado com apenas algumas décadas de cibercultura. Por outro, os problemas enunciados por Lévy na citação acima destacada são geradores de caos e de incertezas, que num contexto cibercultural fazem emergir novas formas de regulação e de controlo, não totalitaristas mas de qualquer das formas reguladoras.
É neste contexto que em 2002 surgiram as Creative Commons, partindo do paradigma legal e proprietário da Era Industrial (“Creative Commons license are based on copyright. So they apply to all works that are protected by copyright law.” (“Before Licensing – CC Wiki,” n.d.)), mas reconhecendo a incapacidade deste em dar resposta à profusão de registos e autores, sua virtualização, nova configuração e potencial de partilha.
Por um lado, ao “novo” e reconfigurado autor é dado o poder de estabelecer os termos de utilização e/ou recriação do seu registo (o mínimo que pode pedir em troca é o reconhecimento da sua condição de autor). Por outro, esses direitos estão diretamente ligados ao registo e são extensíveis a qualquer nó da rede, quer se tenha tomado contacto direto ou não com a sua obra a partir do registo primeiro do seu autor (indicativo da natureza virtual, não territorial e reprodutiva do ciberespaço): “Creative Commons licenses attach to the work and authorize everyone who comes in contact with the work to use it consistent with the license. This means that if Bob has a copy of your Creative Commons-licensed work, Bob can give a copy to Carol and Carol will be authorized to use the work consistent with the Creative Commons license. You then have a license agreement separately with both Bob and Carol.” (“Before Licensing – CC Wiki,” n.d.).
Atualmente as Creative Commons estão na sua versão 3.0, tendo vindo a adaptar-se ao rápido crescimento tanto das formas de disseminação da informação como das formas de sociabilidade que as geram.
Bibliografia
Before Licensing – CC Wiki. (n.d.). Retrieved December 9, 2012, from http://wiki.creativecommons.org/Before_Licensing
crowdfunding / Crowdfunding. (n.d.). Retrieved December 9, 2012, from http://crowdfunding.pbworks.com/w/page/10402176/Crowdfunding
Lévy, P. (2000). Cibercultura. Lisboa: Instituto Piaget.
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Exemplo 1: Creative Commons
Exemplo 2: Tin Can API
Exemplo 3: Crowdfunding